Editorial de Luís Baptista-Martins: Reformar a saúde - Rádio Altitude

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Por todo o país, e de forma particular em alguns hospitais, como o da Guarda, o último fim de semana voltou a ter imensas perturbações no Serviço Nacional de Saúde (SNS). A recorrente falta de médicos de diferentes especialidades é um problema antigo, a que acresce uma nova dor: os jovens médicos não estão disponíveis, nem concedem ao serviço mais horas abdicando do fim de semana alargado ou do gozo de férias legítimas – deixando escalas sem médicos, mas o problema não é pontual, é estrutural.
A obstetrícia foi uma das especialidades de que mais ouvimos falar – a morte de bebé nas Caldas da Rainha, alegadamente por falta de médicos nas urgências, deu notoriedade e dimensão a uma dificuldade ocorrida em muitas unidades. E, desta vez, o problema da falta de médicos não é uma dificuldade exclusiva dos hospitais do interior, foi um problema imenso na área de Lisboa, potencializado pelas “férias” de 10 de junho e feriado de Santo António! Na quinta-feira, e quando ainda não era conhecido o caso das Caldas da Rainha, o Sindicato Independente dos Médicos alertava, na sua página online, que «vai ser complicado parir na Grande Lisboa», resumindo assim a previsão de «catástrofe prevista nas maternidades da Grande Lisboa». Se noutras ocasiões, em que o problema é sentido especialmente no interior, com Lisboa (o poder central) a olhar de soslaio para o assunto, agora foi sentido de forma clara na capital. E o governo terá mesmo de mudar alguma coisa…
A notícia sobre a falta de médicos nas urgências hospitalares não é nova. Nem a incapacidade do governo para reformar a Saúde. Menos de dois anos depois de o SNS ter sido aplaudido por todos pela sua extraordinária capacidade de resposta perante a pandemia, enquanto houve hospitais privados que fecharam no momento mais delicado da Covid-19, ouvimos uma certa elite social e os médicos a falarem constantemente da falta de condições nos hospitais. Mas de que falta de condições falam? Sempre das mesmas: dinheiro! Os médicos sentem-se mal pagos e sem melhor rendimento não se sentem incentivados a manter o esforço que o SNS exige. Compreende-se. Mas esta situação ocorre como consequência, óbvia, da falta de médicos, porque o sistema vive refém da vontade corporativa da Ordem dos Médicos, que se opõe à abertura de mais vagas em medicina. «Enquanto não houver médicos no desemprego, a falta de médicos não se resolve».
De forma corporativa, os médicos não permitem mudanças no sistema. Preferem as melhores condições que o “privado” oferece, naturalmente, ainda que isso signifique o aniquilamento do SNS (segundo se diz, no privado, as grávidas são “sempre empurradas” para a cesariana, aumentando as receitas, e quando alguma coisa corre mal… mete-se a parturiente numa ambulância e “a correr” para o hospital público…). Ano após ano, a Ordem dos Médicos impede o aumento de vagas em medicina; corporativamente os médicos impedem o livre acesso à profissão. Os colégios de especialidade fecham o acesso a especialidades de forma exclusivista, com consequências gravíssimas – nos próximos anos haverá falta de especialistas por culpa exclusivamente deste caminho ignóbil, exclusivista e corporativista. Que façam escolhas, entre a exclusividade no privado ou a exclusividade no público. Que a Ordem não retenha o acesso à profissão aos imigrantes. E que os jovens médicos não pensem só em dinheiro e pensem mais no Juramento de Hipócrates («Prometo solenemente consagrar a minha vida ao serviço da Humanidade») – porque a formação de médicos é essencialmente paga por todos e a ingratidão é estúpida, como diz Miguel Esteves Cardoso.
Se é legitimo que os profissionais de saúde sejam bem remunerados e incentivados, também não podem continuar a dominar o sistema de saúde de acordo com as suas vontades. Os utentes não têm de pagar a fatura da falta de planificação ou da ditadura corporativista da Ordem. Se os médicos, para ganharem bem, têm de fazer dezenas ou centenas de horas extraordinárias, pois que se formem mais médicos e assim o valor dessas horas dará para pagar bem a todos. O que não podemos é continuar a deitar milhões sobre um SNS que só é eficiente quando há pandemia, mas que em períodos normais vai de férias.

Luís Baptista- Martins

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